terça-feira, 5 de março de 2013

Anjo 3#


Depois de algum tempo eu encontrava com a Mayara todos os dias após sair da venda do Seu João. E nós já estávamos ficando melhores amigos. Talvez para ser mais sincero, eu estava me apaixonando.

O Seu João gostava muito de mim, e como eu estava fazendo um mês de trabalho na loja ele decidiu me dar de presente uma bicicleta, seria um presente e também ajudaria na hora de fazer as entregas. Eu fiquei muito feliz, e todos os dias após o serviço eu e a Mayara saímos andando de bicicleta por ai, ela sempre na garupa.

Em todos esses dias nós andávamos até uma arvore que ficava um pouco fora da cidade e sentávamos na sua sombra. Ficávamos horas e horas jogando conversa fora, mas aquela conversa em particular me chamou bastante a atenção.
 
- Eu acho que está chegando a hora de voltar para casa – a voz dela era como musica aos meus ouvidos, um pouco rouca, mas linda.

- Mas acabamos de chegar e você já quer voltar? – eu perguntei sem saber realmente do que ela estava falando.

- Não estou falando dessa casa, estou falando do céu – ela olhava para mim, e era bem seria no que dizia.

- E como você pode ter tanta certeza? – eu me preocupava com o fato de talvez não vê-la mais.

- Tive alguns sonhos estranhos nas noites passadas – ela riu de lado – e parece que terei que voltar, parece que minha missão aqui em breve vai acabar.

- Mas você não me falou nada sobre esses sonhos – eu me questionava sobre a confiança que ela teria em mim, o que eu significava pra ela? E o que isso realmente importava? – quando eles começaram?

- Começaram tem uma semana – ela fez uma pausa e olhou para o céu – Existiam quatro pessoas no sonho, três delas queriam fazer o mal, queria acabar com a vida, três delas eram demônios.

- Como se eles existissem – eu dei de ombros.

- Se anjos existem, se você crê em mim, deve saber que os demônios também existem – o que ela falou me deixou sem graça.

- Então continue por favor – eu pedi pra ela, pois voltei a me interessar naquele assunto estranho.

- A quarta pessoa era um humano, e precisava da minha ajuda. Eu abracei ele, mas os demônios o tiraram de mim – eu percebia o semblante preocupado dela – só que eu não sei quem é essa pessoa, quem eu devo ajudar. Mas as coisas estão chegando a um fim.

- Talvez não, talvez esteja apenas começando – não pude deixar que ela ficasse para baixo, eu tinha que arrumar um jeito de ajudar ela em alguma coisa, e eu não queria que ela fosse embora também.

- Então o fim está começando – ela disse tirando um pouco minhas esperanças.

Aquele dia era um diferente dos outros, nos ficamos apenas ali sentando, sem falar nada. O dia parecia meio triste, nós parecíamos meio tristes. Ela por não saber como ajudar a pessoa do sonho e eu por não querer que ela partisse. Mas ao mesmo tempo em que eu me preocupava achava tudo meio estranho, como ela iria ir embora por causa de um sonho? Isso não fazia muito sentindo. Não é como se anjos e demônios existissem realmente, e se fosse assim deveriam estar nos seus devidos lugares, ou no céu ou no inferno. Mesmo com esse meu pensamento eu tinha medo.

- Eu preciso confessar algo – eu disse quebrando o silencio que já estava instalado a muito tempo. Ela não disse nada, apenas assentiu com a cabeça – eu não quero ficar sem você - eu disse meio triste e sem querer tirando uma risada dela.

- Você é bobo – as palavras dela não faziam sentindo para mim, como é bobo ficar com medo de perder alguém? – Você já deveria saber que eu sempre estarei cuidando de você do céu, eu não vou te deixar, você não vai ficar sem mim.

- Eu não quero você no céu, eu quero você aqui, do meu lado – eu estava meio irritado com a calma que ela respondia aquilo – Eu quero passar os dias com você, sair da venda do seu João e andar de bicicleta por ai com você todos os dias – eu ri de lado lembrando de uma coisa que havia acontecido mais cedo – eu quero continuar quase atropelando velhinhas com você – ela riu.

- É, a gente precisa ver isso ai, acho que a gente pode dar um jeito nisso – ela disse levantando e trazendo a esperança para mim novamente – Me encontre amanha aqui e vamos ver o que podemos fazer – e assim ela foi pra casa correndo.

Permaneci sentando embaixo da arvore por mais tempo, a lua já estava no seu máximo quando decide ir para casa. Fui andando devagar empurrando a bicicleta. Estava um pouco feliz por saber que no dia seguinte as coisas poderiam ter mudado. Foi quando antes do que eu esperava as coisas começaram a mudar.

- Você parece gostar mesmo daquela esquisitinha – uma voz veio por atrás de mim.

- Quem é você? – estava de noite e eu não conseguia enxergar muito bem, mas a voz não era estranha.

- Quando você chegou na cidade eu pensei que você poderia ser diferente, que seria como um de nós, mas vejo que não tem jeito para você, que aquela esquisitinha já te poluiu com as esquisitices dela.

- Você não fale assim da Mayara – eu conhecia aquele tom de voz esnobe – você não tem o direito de falar assim dela Luana.

- Então você lembra de mim não é? – aquela noite ela estava sozinha.

- O que você faz aqui?

- Você não percebe né? Nunca percebeu? Você sabe que eu moro do outro lado da cidade, e que todos os dias eu vou naquela espelunca daquele português safado só pra comprar coisas que eu não preciso. Só pra ver você, e você não me percebe – ela correu até mim e me abraçou – você é um idiota, eu pensei que você era um rapaz inteligente, como eu pude me apaixonar por um idiota estranho?

- O que? – eu fiquei meio atordoado com o que ela dizia, coisas sem noção, ofendendo pessoas que não mereciam, e aquela palavra ficou ecoando na minha cabeça “apaixonar” – eu não entendi muito bem o que você disse?

- É, você é mesmo um idiota – ela repetiu ainda abraçada em mim, minha bicicleta caiu de lado – você não sabe nem prestar atenção nos sinais.

- Já está ficando tarde, é melhor eu te levar pra casa, você está muito longe de casa – eu disse me livrando do abraçado dela e pegando minha bicicleta.

Subi na bicicleta e ela subiu atrás, ela me abraçou e eu fui embora. A noite tinha ficado muito estranha. Mais estranho ainda é que eu não sabia que quando passei na cidade com a Luana abraçada em mim, a Mayara viu tudo.

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